Gordo é raça ruim, já disse. Não importa qual: o recém-cirurgiado, o que
se prepara pra cirurgia ou o coitado que continua no esquema da dieta
do abacaxi. Esse último sujeito tem o meu respeito (não que eu ache que
eu perdi o meu ao decidir botar pra foder e cortar metade do estômago
fora – come on, cada um carrega consigo sua bagagem histórica ou
clínica).
O fato é que sempre tem uma história particular sobre o
momento-ponto-final que fez o gordo tomar a decisão de cortar o
estômago. A Internet tá cheia delas – na maioria das vezes são todas de
cunho dramático. É que gordo é tudo fodido, mesmo. Mas, coitados, jamais.
Eu, por exemplo, sou exemplo clássico da malandragem e meu ponto
final aconteceu em Goiás, na Chapada dos Veadeiros - local mais
conhecido por habitar uma excêntrica vegetação, simpáticos cristais,
cachoeiras de presença, hippies, maconheiros e a parte magra da
população. É de conhecimento dos senhores, é claro, que gordo não faz
trilha, gordo come e hiberna. Mas eu sou a P. Geller, gordinha gente-boa. Eu sou um estouro, eu sou on the rocks e eu não perco a oportunidade de ficar entalada em nenhum lugar.
Comi uma coxinha, desci uma trilha mínima (íngreme, mas ainda
mínima), me postei sob o planeta solar, enquanto peixes me aborreciam ao
rio, e fumei um cigarro após o outro, até o sol ir embora. Chegado o
momento de ir embora, consegui alcançar metade do caminho, repensei, fiz
a Kátia, fingi que não vi que estava ficando pra trás, estanquei em
algum ponto alto e, com a respiração ofegante e meu peito se
contorcendo, doendo como dói a um cardíaco, pensei: “Só saio daqui de
helicóptero, queridos”.
É claro que, como todo bom gordo, imaginei a cena do helicóptero
toda em minha cabeça, enquanto, sentada e humilhada, pensava em acender
mais um cigarro, só pra matar tempo: O helicóptero chegaria cinco horas
depois, lançaria uma rede de capturar golfinhos e eu seria içada como um
objeto redondo não exatamente identificado pelos aborígines que ali
próximos me observariam subir aos céus, exatamente como Jesus, no
terceiro dia.
Contei cinco minutos, olhei pra cima, vi que alguns amigos, já
cientes do meu fracasso físico, esperavam mais acima - outros
continuavam a caminhada achando que eu me recuperaria rápido, afinal, eu
havia fumado demais. Foi ali, sentada numa pedra que fazia doer o
cóccix, sob o sol e o céu do cerrado, avistando meus amigos, aqueles
cretinos magros, desbravando com leveza aquela floresta enquanto eu me
pensava içada por uma aeronave, que me constatei fodida.
Aliás, sou tão fodida que já viajei por países incríveis, podia ter
várias histórias incríveis relativas à minha incrível decisão de
submeter-me à donzela bariátrica, mas meu ponto-final aconteceu em
Goiás, no meio do mato, com moscas voando sob minha cabeça. Ali, iniciei
o projeto musa-verão 2011 e espero alcançar o êxito. Do contrário, vou
morar na índia, que lá nós somos valorizadas.